Órgão Oficial de Divulgação Científica da
Sociedade Brasileira de VideocirurgiaISSN: 1679-1796
ANO 4 Vol.4 Nº 4 - Out/Dez 2006<< Arquivo PDF >>
Micobacteriose - Um Sinal de Alerta
Micobacteriosis - A Signal of Alert
Homero Meirelles Junior
Meirelles Junior H. Micobacteriose - Um Sinal de Alerta. Rev bras videocir 2006; 4 (4):149-150.
videocirurgia, técnica revolucionária e minimamente invasiva, sempre teve, dentre suas inegáveis vantagens, uma incidência baixíssima de infecção pós-operatória. A recente epidemia (já reconhecida como tal pelo Ministério da Saúde) de Micobacteriose nas punções laparoscópicas, que vem ocorrendo no Rio de Janeiro nos últimos 6 meses, fez com que 550 médicos, enfermeiros e instrumentadoras se reunissem num simpósio específico sob este tema, organizado pelo CBC e pela SOBRACIL-RJ. O expressivo número de participantes já mostra por si só a seriedade do problema, que está servindo como um sinal de alerta para todos os profissionais de saúde envolvidos.
O quadro clínico mais freqüente é de um granuloma no local da punção, com formação de abscesso e fístula entre 3 a 5 semanas após a cirurgia laparoscópica, acometendo vários portais, necessitando antibioticoterapia prolongada (4 a 6 meses) e remoção cirúrgica, quase sempre até o peritônio, com incisões 3 a 4 vezes maiores que a incisão laparoscópica inicial.
Embora o grande "vilão" seja uma Micobactéria, transmitida pela água, que sofreu uma mutação genética, provavelmente, ficando resistente ao Glutaraldeido, certas condições desfavoráveis de limpeza e esterilização do instrumental videocirúrgico favoreceram o crescimento destes germes e sua propagação. Segundo palavras da Dra. Margareth Dalcomo, especialista do Ministério da Saúde, a epidemia do Rio de Janeiro já apresenta características diferentes daquela ocorrida em 2004/2005 em Belém do Pará, o que faz pensar que o germe tenha sofrido novas mutações.
Importante lembrar a RDC nº 156 de 11/8/2006, que proíbe o reuso não só de instrumental descartável como também de pinças, tesouras, bisturis energisados e trocateres não desmontáveis. Esta RDC, muito discutida e criticada, mostra uma preocupação extremamente importante com a limpeza e esterilização do instrumental, procedimentos que são prejudicados quando o instrumento não pode ser desmontado, seja ele permanente ou descartável. Já está comprovada a existência de um biofilme intra-luminar nestes instrumentos, com material orgânico tolerante a agentes microbianos, incapazes de serem esterilizados. Se um instrumental cirúrgico não pode ser corretamente limpo, este biofilme não será retirado, e o instrumental não poderá ser corretamente esterilizado e, portanto, não poderá ser reutilizado, seja ele permanente ou descartável. A limpeza do instrumental é tão ou mais importante que a forma de esterilizar, pois, embora óbvio, é importante lembrar que não existe sujeira estéril!
No Rio de Janeiro, 22 hospitais públicos e privados já apresentaram casos desta epidemia que, segundo cálculos da Secretaria Municipal de Saúde, já deve ter atingido mais de 400 pacientes (embora "apenas" 156 tenham sido notificados até 24/3/07). A maioria destes hospitais está investindo em treinamento de enfermeiras e instrumentadoras, centros de limpeza/esterilização, assim como aquisição de instrumental videocirúrgico permanente e desmontável, visando o "padrão-ouro" da limpeza (equipamento ultrassônico) e da esterilização (Autoclave e/ou Statin), abandonando a curto/médio prazo a "Desinfecção de Alto Nível" através de meios líquidos, seguindo recente portaria da ANVISA de fevereiro de 2007 que recomenda que "todo instrumento cirúrgico que penetra deve ser esterilizado (e não desinfectado)".
Hospitais, cirurgiões, enfermeiras e instrumentadoras, todos estão aprendendo com esta epidemia, e o engajamento precoce e profícuo das instituições governamentais de saúde (Ministério e Secretarias Estadual e Municipal) é um fator de suma importância para que o atendimento às pacientes seja amplo e eficiente. Todos nós temos que nos conscientizar que mudanças são necessárias, para que os inquestionáveis benefícios da videocirurgia não sejam questionados e eclipsados por uma micobactéria mutante e resistente.
Homero Meirelles Junior
Secretário-Geral da Sobracil
![]()