Órgão Oficial de Divulgação Científica da
Sociedade Brasileira de VideocirurgiaISSN: 1679-1796
ANO 3 Vol.3 Nº 1 - Jan/Mar 2005<< Arquivo PDF >>
Resultados Preliminares da Tireoidectomia Minimamente Invasiva Vídeo-Assistida
Preliminary results of the minimally Invasive video assisted thyroidectomy
Rogério Aparecido Dedivitis, André Vicente Guimarães
Trabalho realizado Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Ana Costa, Santos
OBJETIVO: A tireoidectomia minimamente invasiva vídeo-assistida TIMIVA tem sido considerada segura, com vantagens estéticas e pós-operatórias". Nosso objetivo é comparar os resultados da TIMIVA com a tireoidectomia convencional. CASUÍSTICA E MÉTODO: Tipo de estudo - revisão retrospectiva de prontuários. Grupo I: 12 pacientes foram submetidos a hemitireoidectomia e 3 a tireoidectomia total, através da TIMIVA, de Junho a Agosto de 2004. Grupo II: 23 pacientes foram submetidos a tireoidectomia convencional. Gênero, idade, volume do bócio, maior diâmetro do nódulo dominante, tempo cirúrgico, queixa de dor durante o primeiro dia de pós-operatório, tempo para alta hospitalar, resultados estéticos e complicações (paralisia de prega vocal, infecção, hematoma e hipoparatireoidismo) foram analisados. RESULTADOS: No grupo da TIMIVA, todos os pacientes eram do gênero feminino, a mediana etária foi igual a 34 anos, a mediana do volume do bócio igual a 16,5 mL, a mediana do maior eixo do nódulo dominante 2,3 cm, 10 pacientes relataram dor discreta no sítio cirúrgico, a mediana da cicatriz foi de 2,0 cm e todos consideraram os resultados estéticos excelentes. No grupo da convencional, o gênero feminino prevaleceu em 6,6:1, a mediana etária foi 35 anos, a mediana do volume do bócio 35 mL, a mediana do nódulo dominante 3,5 cm, 15 pacientes referiram discreta, 6 moderada e 2 dor severa, a mediana da cicatriz foi 5,0 cm, 18 pacientes consideraram os resultados estéticos excelentes e 5 como bons. Em ambos os grupos, a mediana de tempo cirúrgico foi 55 minutos, todos receberam alta no primeiro dia de pós-operatório e não houve complicações. CONCLUSÕES: A TIMIVA proporciona excelente resultado estético, pouca dor e baixo índice de complicações.
Palavras-chave: tireoidectomia, endoscopia, minimamente invasivo, tireóide.
OBJECTIVE: The minimally invasive video-assisted thyroidectomy (MIVAT) has been considered as a safe procedure with additional advantages on cosmesis and outcome. Our aim is to compare the results of MIVAT and the conventional thyroidectomy. MATERIAL AND METHODS: Type of study: Retrospective chart review. Group I: 12 patients underwent hemithyroidectomy and 3 underwent total thyroidectomy through MIVAT from June to August, 2004. Group II: 23 patients underwent conventional thyroidectomy during the same period. Gender, age, goiter volume, major diameter of the dominant nodule, surgical time, pain complaint during the first postoperative day, discharge time, cosmetic result and complications (vocal fold palsy, infection, hematoma and hypoparathyroidism) were analyzed. RESULTS: In MIVAT group, all the patients were women, the median age was 34, the goiter volume median was 16.5 mL, the nodule major diameter median was 2.3 cm, 10 patients related mild pain in the surgical site, the scar size median was 2.0 cm, all the patients considered the cosmetic results as excellent. In the conventional group, the women/men ratio was 6.6:1, the age median was 35, the goiter volume median was 35 mL, the dominant nodule size median was 3.5 cm, 15 patients related mild, 6 related moderate and 2 related severe pain, the scar size median was 5.0 cm, 18 patients considered the cosmetic results as excellent and 5 patients as good. In both groups the surgical time median was 55 minutes, all the patients were discharged in the first postoperative day, and there was no complication. CONCLUSIONS: In MIVAT procedure there are excellent cosmetic results, little pain and low complication rates.
Key words: thyroidectomy, endoscopy, minimally invasive, thyroid.
DEDIVITIS RA, GUIMARÃES AV. Resultados Preliminares da Tireoidectomia Minimamente Invasiva Vídeo-Assistida. Rev bras videocir 2005;3(1):21-25
Recebido em 06/02/2005
Aceito em 28/02/2005
primeiro relato sobre o acesso cervical vídeo-endoscópico foi publicado por Gagner, em 19961, que o experimentou em paratireoidectomia. Dentre os diferentes procedimentos descritos posteriormente, a tireoidectomia minimamente invasiva vídeo-assistida (TIMIVA), sem insuflação de gás, foi desenvolvida principalmente na Itália2,3. A TIMIVA demonstrou tratar-se de um procedimento seguro, com vantagens adicionais quanto aos resultados cosméticos e evolução pós-operatória4. O objetivo do presente estudo é apresentar os resultados da experiência inicial com a TIMIVA.
PACIENTES E MÉTODO
valiamos retrospectivamente o prontuário de pacientes submetidos a tireoidectomia no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Ana Costa, Santos, que foram divididos em dois grupos.
O grupo I constituiu-se de 12 pacientes, consecutivos, submetidos a lobectomia com istmectomia, para o tratamento de doença nodular da tireóide, e outros 3 pacientes submetidos a tireoidectomia total _ sendo dois para tratamento de carcinoma papilífero de tireóide, empregando-se a TIMIVA, no período compreendido entre Junho e Agosto de 2004. O grupo II foi formado por 23 pacientes, consecutivos, submetidos a tireoidectomia convencional, durante o mesmo período.
Os critérios de inclusão no grupo I (TIMIVA) foram baseados nos seguintes aspectos5: diâmetro máximo do nódulo de 35; volume máximo do bócio de 20 mL; e, ausência de sinais ultra-sonográficos e laboratoriais de tireoidite. Os pacientes que não atendiam tais critérios foram incluídos no grupo II. Todos os pacientes do grupo TIMIVA concordaram com a realização da técnica e foram notificados quanto à possibilidade de conversão para a técnica convencional.
Todas as operações foram realizadas pelos autores.
PROCEDIMENTO
O procedimento _ TIMIVA, empregado pelos autores, foi baseado na técnica descrita por Miccoli et al6, com algumas modificações.
O cirurgião fica à direita do paciente e o primeiro auxiliar fica à esquerda, ambos á altura da região cervical. O auxiliar responsável pela manipulação da óptica fica à esquerda do paciente e ao lado do primeiro auxiliar (à sua esquerda). O instrumentador fica à direita do paciente e ao lado do cirurgião (à sua direita).
Utilizou-se uma óptica de zero grau, 5 mm (Storz®, Germany). A hemostasia do pedículo tireoidiano superior foi realizada com bisturi harmônico e pinça CS14C (UltraCision®, Ethicon Endo-Surgery, Inc. - EUA). Não foi realizada drenagem em nenhum caso. O fechamento da pele foi feito com selante a cianoacrilato.
ASPECTOS ANALISADOS
Gênero, idade, volume do bócio, diâmetro do nódulo dominante, tempo cirúrgico, queixa de dor no pós-operatório imediato, tempo para alta hospitalar, resultados cosméticos e complicações (paralisia de prega vocal, infecção, hematoma e sinais clínicos de hipoparatireoidismo) foram avaliados em ambos os grupos. Para fins de análise, a dor foi acessada no intervalo pós-operatório imediato através de uma escala semi-quantitativa de 0 a +++ e auto-aplicada por cada paciente. Todos os pacientes receberam apenas dipirona intravenosa a cada 6 horas, durante o período pós-operatório imediato, para fins de analgesia. A mobilidade das pregas vocais foi verificada entre o 7º e o 10º dia de pós-operatório, através de vídeo-laringoscopia realizada ambulatorialmente. Os resultados cosméticos foram aferidos, com 2 meses de pós-operatório, através de registro da avaliação pessoal de cada paciente, de acordo com a seguinte escala protocolar oferecida: 1 - aceitável; 2 - bom; e 3 - excelente.
RESULTADOS
Os aspectos analisados estão resumidos na Tabela-1. No grupo I (TIMIVA), todos os pacientes eram do gênero feminino, a mediana etária foi de 34 anos, a mediana do volume do bócio foi de 16,5 mL, a mediana do diâmetro do nódulo dominante foi de 2,3 cm, a mediana do tempo cirúrgico foi de 55 minutos, todos os pacientes foram de alta hospitalar no primeiro dia de pós-operatório, 10 pacientes referiram dor discreta no sítio cirúrgico e 5 negaram dor, a mediana do tamanho da cicatriz cirúrgica foi 2,0 cm, todos os pacientes consideraram os resultados cosméticos como excelente e não houve complicações.
No grupo II (tireoidectomia convencional), a proporção feminino/masculino foi de 6,6:1, a mediana etária foi de 35 anos, a mediana do volume do bócio foi de 35 mL, a mediana de tamanho do nódulo mediano foi de 3,5 cm, a mediana do tempo cirúrgico foi também de 55 minutos, todos os pacientes foram de alta hospitalar no primeiro dia de pós-operatório, 15 pacientes referiram dor discreta, 6 pacientes relataram dor moderada e 2, dor severa no primeiro pós-operatório, a mediana de tamanho da cicatriz foi de 5,0 cm, 18 pacientes consideraram os resultados cosméticos como excelentes, enquanto 5 pacientes consideraram como bom e não houve complicações.
Tabela 1 - Aspectos dos pacientes submetidos a TIMIVA e tireoidectomia convencional.
Aspecto Grupo I (TIMIVA)
n = 15
Grupo II (convencional)
n = 23
Gênero feminino: 15 feminino: 20
masculino: 3Idade (anos) mediana: 34
26 a 68mediana: 32
22 a 65Volume do bócio (mL) mediana: 16.5
11.1 a 20mediana: 35
13.5 a 155Tamanho do nódulo (cm) mediana: 2.3
0.6 a 3.2mediana: 3.5
0.8 a 5.5Tempo cirúrgico (min) mediana: 55
40 a 100mediana: 55
35 a 75Tempo de alta (dias) 1 1 Dor pós-operatória 0: 5
+: 10+: 15
++: 6
+++: 2Tamanho da cicatriz (cm) mediana: 2.0
1.5 a 2.0mediana: 5.0
3.5 a 7.0Resultados cosméticos excelente: 15 excelente: 18
bom: 5Complicações não não
DISCUSSÃO
Somente cerca de 15% dos pacientes atingem os critérios de inclusão7. Em outro relato do mesmo grupo, em um total de 5450 pacientes submetidos a tireoidectomia, 579 foram elegíveis para a realização da TIMIVA8.
A mediana do tempo cirúrgico da TIMIVA foi de 55 minutos para a hemitireoidectomia e de 65 minutos para a tireoidectomia total, sendo semelhante ao tempo utilizado no procedimento convencional. Considerando ser inicial nossa curva de aprendizado para a TIMIVA, acreditamos que o tempo cirúrgico possa ser melhorado com aumento da experiência. Em 579 pacientes submetidos á técnica, a média de desvio padrão foi de 41 +/- 19,5 minutos (variando de 15 a 120 minutos) para a hemitireoidectomia e de 51,6 +/- 18,8 minutos (variando de 30 a 140 minutos) para a tireoidectomia total8.
A escolha do bisturi harmônico para a realização da técnica nesta série foi baseada nas experiências já registradas com o procedimento, tendo em vista suas vantagens em assegurar boa hemostasia, mesmo em campo cirúrgico limitado9.
Em nossa casuística, não houve conversão da TIMIVA para a tireoidectomia convencional. Em outra série, em 427 pacientes, o índice de conversão foi de 1,2% (5 casos)10.
Não ocorreu paralisia de nervo recorrente, hematoma ou infecção, neste estudo. Assim como na tireoidectomia convencional, o nervo laríngeo recorrente é sistematicamente identificado e preservado na TIMIVA. No entanto, a técnica minimamente invasiva vídeo-assistida permite, adicionalmente, a fácil e rotineira identificação do nervo laringeo superior, sob visão direta, durante a dissecção do pedículo tireoidiano superior11.
A TIMIVA proporciona melhor resultado cosmético e menor necessidade de analgesia, colaborando para uma recuperação pós-operatória mais confortável.") O tamanho da cicatriz é menor que na tireoidectomia convencional, o que tem particular impacto no gênero feminino. A menor intensidade de dor pode ser justificada pela reduzida área de dissecção e pela não realização de hiperextensão cervical durante o procedimento. Realizamos a avaliação cosmética após um mês de pós-operatório. No entanto, os resultados tendem a melhorar após seis meses nos procedimentos vídeo-assistidos12.
Recentemente, pequenos carcinomas papilíferos de tireóide passaram a ser abordados de forma apropriada com a introdução da técnica vídeo-assistida, já que a ressecção alcançada é adequadamente radical13. Nossos dois casos de carcinoma papilíferos mediam 6 e 8 mm. A tireoidectomia total é o procedimento de escolha para os carcinomas bem diferenciados de tireóide em nossa instituição.
CONCLUSÕES
Os resultados iniciais analisados na presente série nos permitem concluir que a TIMIVA apresenta aspectos cosméticos satisfatórios, concorre para menor intensidade de dor e desconforto pós-operatório, representando uma indicação segura em casos selecionados.
Outros estudos randomizados e prospectivos devem ser realizados no sentido de refinar os critérios de indicação, assim como apreciar os custos operacionais e suas vantagens, no sentido de melhor estabelecer a viabilidade do procedimento na prática médica de rotina.
Referências Bibliográficas
1. Gagner M. Endoscopic subtotal parathyroidectomy in patients with primary hyperparathyroidism. Br J Surg. 1996;83(6):875.
2. Bellantone R, Lombardi CP, Raffaelli M, Rubino F, Boscherini M, Perilli W. Minimally invasive, totally gasless video-assisted thyroid lobectomy. Am J Surg. 1999;177:342-343.
3. Miccoli P, Berti P, Bendinelli C, Conte M, Fasolini F, Martino E. Mininally invasive video-assisted surgery of the thyroid. Langenbecks Arch Surg. 2000;385:261-264.
4. Miccoli P, Bellantone R, Mourad M, Walz M, Raffaelli M, Berti P. Minimally invasive video-assisted thyroidectomy: multiinstitutional experience. World J Surg. 2002;26:972-975.
5. Miccoli P, Berti P, Raffaelli M, Materazzi G, Baldacci S, Rossi G. Comparison between minimally invasive video-assisted thyroidectomy and conventional thyroidectomy: A prospective randomized study. Surgery 2001;130:1039-1043.
6. Miccoli P, Berti P, Raffaelli M, Conte M, Materazzi G, Galleri D. Minimally invasive video assisted thyroidectomy. Am J Surg. 2001;6:567-70.
7. Miccoli P, Materazzi G. Minimally invasive, video-assisted thyroidectomy (MIVAT). Surg Clin N Am. 2004;84(3):735-41.
8. Miccoli P, Berti P, Materazzi G, Minuto M, Barellini L. Minimally invasive video-assisted thyroidectomy: five years of experience. J Am Coll Surg. 2004;199(2):243-8.
9. Shemen L. Thyroidectomy using the harmonic scalpel: Analysis of 105 consecutive cases. Otolaryngol Head Neck Surg. 2002;127(4):284-288.
10. Miccoli P, Minuto MN, Barellini L, Galleri D, Massi M, D'Agostino J, Materazzi G, Berti P. Tiroidectomia video-assistita minimamente invasiva (Mivat) _ cenni di tecnica e risultati di 4 anni di esperienza (Analisi della casistica 1999-2002). Ann Ital Chir. 2004;75(1):47-51.
11. Berti P, Materazzi G, Conte M, Galleri D, Miccoli P. Visualization of the external branch of the superior laryngeal nerve during video-assisted thyroidectomy. J Am Coll Surg. 2002;195(4):573-574.
12. Miccoli P, Bendinelli C, Berti P, Vignali E, Pinchera A, Marcocci C. Video-assisted versus conventional parathyroidectomy in primary hyperparathyroidism: A prospective randomized study. Surgery 1999;126:1117-1122.
13. Miccoli P, Elisei R, Materazzi G, Capezzone M, Galleri D, Pacini F, Berti P, Pinchera A. Minimally invasive video-assisted thyroidectomy for papillary carcinoma: A prospective study of its completeness. Surgery 2002;132(6):1070-1074.
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Rogério A. Dedivitis
Rua Dr. Olinto Rodrigues Dantas, 343 conj. 92
CEP. 11050-220 Santos, SP
Telefax: (13) 3221-1514 / 3223-5550
E-mail: dedivitis.hns@uol.com.br